Sabe aquela história de que “somos aquilo que comemos”? Pois é, é sobre isso que quero falar com você. Você sabe quem é você neste contexto? Muito provavelmente você esteja aí tentando entender onde estas perguntas querem te levar. Eu te conto.
Há alguns anos atrás, a comida que ia para a mesa do consumidor era cultivada como comida, as pessoas sabiam de onde vinham seus alimentos, quem e como haviam sido produzidos. A comida realmente nutria como comida e a saúde era de ferro, como se dizia. Isso era possível porque o consumo de alimentos orgânicos não era tido como luxo e sim como algo natural. Além disso, as pessoas valorizavam o conhecimento tradicional e não se entupiam de medicamentos.
Mas, quem fez com que os alimentos orgânicos, produzidos e consumidos de forma justa fossem colocados na prateleira de produtos para poucos e inseridos neste discurso de comida de luxo?
Foi o sistema de produção de alimentos, um fluxo de produção que transforma tudo em commodity, um esquema que tem como objetivo produzir mais gastando menos e gerar muito lucro. Sustentado por incentivos políticos e econômicos, este sistema pressiona comunidades, ameaça pequenos agricultores, devasta florestas e ameaça nossa biodiversidade. Estamos falando da agricultura e da pecuária, responsáveis por 80% do desmatamento do planeta. Estas áreas desmatadas são destinadas à pastagem ou às monoculturas como a soja, da qual o Brasil é o maior exportador mundial. E quer saber mais? A infinita parte desta produção serve de alimento, não para humanos, mas sim para gados, galinhas e porcos. Ao final disso tudo temos sim alimentos mais baratos, com preços impossíveis de serem comparados aos produtos orgânicos. Mas, a que custo isso é possível? Quem paga esta conta?
Além de mecanizar a produção e incluir muito veneno no manejo, este esquema ignora as formas de produção sustentáveis testadas e comprovadas por indígenas e comunidades tradicionais, empurra estes povos às margens do debate sobre agricultura, contribui para alargar a faixa de desigualdade social e faz com que hábitos alimentares e culturais sejam deixados para trás. E lá se vai a nossa saúde e a nossa identidade!
Cada vez que deixamos de incentivar o consumo da produção local ou de alimentos sem veneno estamos fortalecendo essa indústria desenfreada e permitindo que um pouco de nós seja esquecido e, ainda pior que isso, comprometemos as vidas futuras já que, com o desmatamento, as florestas deixam de consumir o dióxido de carbono enquanto a pecuária e a monocultura geram ainda mais carbono. Eu nem precisaria dizer, mas vou reforçar: esta é a condição perfeita para o aquecimento global e muito impacto ambiental. A conversa iria ainda mais longe se fossemos falar sobre os famosos agrotóxicos, estes encurtadores da saúde humana.
Entendeu como isso tem a ver com você? Se você leu até aqui e não é um militante, ainda, deve estar se perguntando “o que eu posso fazer se as coisas são assim?”
Eu diria que devemos começar revertendo a ideia de que comer orgânicos (sem lixo) seja luxo. Esta foi a pior mentira que nos contaram para que tantos transgênicos e alimentos com veneno pudessem ocupar as prateleiras dos alimentos de verdade. Outra ação urgente é resgatar o conhecimento tradicional, esta é forma mais genuína de não sermos atropelados por esta indústria — e eu incluiria aqui a indústria farmacêutica. Considerar o vegetarianismo ou o veganismo é também algo a ser feito – menos demanda, mais floresta em pé e menos animais mortos são bons motivos, não acha? Pressionar os governos por políticas justas de comércio: “não queremos fazer negócios multinacionais e países devastadores”, “queremos a proteção das terras indígenas”, “não queremos comer veneno”, “queremos incentivo para as formas de cultivo sustentáveis” e mais uma porção de pautas precisam da nossa atenção e manifestação diária.
E aí? Já sabe quem você quer ser neste contexto?